Junho, o mês do Orgulho LGBTQ+, e de cada vez mais bandeiras de diversidade. O LinkedIn se divide entre empresas que enchem a rede de cores, as mais diversas, e aquelas que permanecem indiferentes.

Até pouco tempo atrás, eu interpretava essa indiferença, ou melhor, a ‘neutralidade’, como uma posição corporativa aceitável - até, talvez, uma escolha ‘racional’ ou ‘pragmática’. Não me importava muito em não ver representação nas páginas de carreiras, na mídia dessas empresas, nas datas que trazem visibilidade a minorias.

Contudo, um evento específico mudou minha visão, e conversando com mais pessoas, reavaliei minha percepção de mundo. Hoje defendo o oposto: neutralidade é, frequentemente, escolher o lado errado.

Há alguns anos, eu embarcava em um voo fora do país pela Delta. No jetbridge, estava, enorme, um cartaz com um casal gay utilizando os serviços da companhia.

Photo by Jeff Baker

O meu sentimento vendo esse cartaz foi de felicidade absoluta - até então eu nunca tinha visto uma companhia aérea tendo a coragem de colocar um casal gay em uma peça publicitária. Ou melhor, não só uma companhia aérea - nunca tinha visto academias, restaurantes, corretoras de seguro, marcas de carro, colocarem um casal gay numa publicidade assim, fisicamente, para o mainstream, longe de qualquer filtro ou segmentação.

Mas não foi somente felicidade - também foi acompanhada de uma certa ambivalência. Qual dia eu veria uma Gol, Latam, Azul, fazer o mesmo no Brasil? Colocar uma peça num jetbridge ou lugar semelhante, onde nenhum homofóbico teria a opção de não olhar, vinculando essa peça a seu produto ou marca?

O motivo é aparentemente inofensivo, mas prejudicial - empresas escolhem adotar a dita neutralidade.

Photo by Scott Umstattd

A neutralidade parte do princípio que tal corporação não tem interesse de ser um agente social. Ela não ativamente inclui minorias - mas, em tese, também não exclui. Ela não toca no assunto de vieses em processos seletivos ou ciclos de promoção - mas, em tese, também não discrimina.

Essa neutralidade, contudo, representa mais do que simples inação. Ora, nenhuma empresa existe no vácuo, ou passa a existir a partir do nada - mas sim, faz parte de um tecido social. Pessoas não passam a existir no momento de uma contratação - mas sim, carregam vieses prévios para dentro de uma organização.

Photo by Omar Flores

Escolher ser neutro, então, não significa construir uma organização imaculada - mas significa, simplesmente, construir uma que aceita o status quo. Isto é, as piadinhas, a discriminação, os vieses, a dúvida sobre a capacidade técnica de minorias entrarão pela porta da frente da sua empresa, no momento que ela decide por fazer nada.

Para tornar isso um pouco mais tangível, vamos ao exemplo da companhia aérea - o que passa pelo processo decisório de uma empresa quando essa coloca, entre dezenas ou centenas de peças, nenhuma com um casal não-normativo?

Parte, vem da falta de representatividade - muitas vezes, isso é sequer uma ideia. E parte, em português claríssimo, do receio de perder aquele outro cliente, o homofóbico, o qual vai preferir escolher a concorrência ao tomar conhecimento de uma dessas peças - ou seja, a neutralidade para tal empresa retirou um risco de boicote ou backlash.

A organização decide assim, subscrever ao status quo, herdando, estruturalmente, um posicionamento que discrimina/exclui o seu próprio cliente LGBT, pois essa priorizou aquele outro cliente, o homofóbico.

Publicidade já é um assunto importante o suficiente para a discussão, mas o que acontece além dela?

O que acontece com minorias em processos seletivos, em ciclos de promoção, em desenvolvimento de times e de produtos quando se decide pela neutralidade, por decidir não pagar o justo preço de se falar e agir inclusivamente?